Positividade Tóxica no Autismo

Forçar a exibição de um sentimento irreal reprime a emoção sentida, acumulando a sua intensidade - o que leva às consequências danosas 



Por Ariella Dias - psicopedagoga e terapeuta ABA



No mundo tecnológico repleto da exposição social com o que há de melhor para viver, demonstrar tristeza não pega bem, nem gera “curtidas” capazes de causar a admiração nas redes sociais. Logo, o movimento “Good Vibes Only” que, na tradução, significa “Apenas Boas Energias”, atua com força. Inclusive, recriminando quem não se esforça para sorrir ou simplesmente não expressa a mesma intensidade das “emoções positivas”.

Mas, o que se entende por “emoções positivas”? Seria aquela revelada por quem está sempre sorrindo ou seria aquela exposta nas redes sociais com o máximo de situações divertidas? 

Fato é que realmente não há quem goste de estar ao lado de pessoas mal humoradas ou que vivem reclamando de tudo. E, nesse campo, não pode ser desconsiderada a importância do incentivo para enxergar por outros prismas mais inspiradores as situações indesejadas. 

Mas, onde quero chegar não é a questão “Good Vibes” e sim a  “Good Vibes ONLY”. Uma vez que as “Boas Energias” são sempre desejadas, mas a “Only” não seria uma ilusão distante da sociedade da modernidade líquida de Bauman

Segundo o respeitado sociólogo e filósofo, a condição contemporânea da sociedade é marcada por suas relações fluidas, voláteis e dinâmicas. Isto é, pela falta de forma fixa ou duradoura que possam trazer segurança e previsibilidade às pessoas. Condições de natureza efêmera que acaba por resultar na estabilidade frágil.  

Nesse sentido, o apelo à “Apenas Boas Energias” não condiz com a vida perfeita no mundo real, que supõe algo errado com quem não participa desse movimento. Estudos científicos alertam sobre os danos causados pela repressão das emoções sentidas. E, no mundo autista, isso é ainda mais grave por provocar o masking - a camuflagem social.   

A expressão positividade tóxica em oposição à perspectiva otimista exacerbada, infere sobre o entendimento de qualquer pessoa em seus desafios diários sentir raiva, medo, dor e mau humor. Como um estado impermanente aceito com mais naturalidade.  

Fingir estar feliz quando se está triste e reprimir o choro, dentre outras situações, são atitudes que invalidam as emoções dos indivíduos. E, no caso do autismo, leva ao meltdown e shutdown (termos em inglês que significam sucessivamente “colapso” e “desligamento”). Ou seja, no primeiro caso, provoca uma crise explosiva extrema com gritos, choro, agressividade ou isolamento e, no segundo, a falta de energia suficiente para expressar-se seja por meio de limitar a comunicação ou anular. 

Desse modo, fica clara a necessidade de moderação naquilo que se prega e é defendido de forma linear. Pois, no mundo líquido que vivemos não existe linearidade. Os sentimentos existem e são reais, o que precisamos não é reprimir, mas sim aprender a lidar com eles, com estratégias que sejam capazes de nos auxiliar a fazer a gestão das nossas emoções, o que é muito diferente da negação.  

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